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O Playstation 4 Vai Custar Caro

Posted on Thursday, February 21, 2013

Por Marcel R. Goto

O evento de ontem, no qual a Sony finalmente apresentou o Playstation 4 ao mundo, foi marcado mais pelo que estava ausente dele do que pelo que foi mostrado.

O próprio console não estava lá, para começar, então o PS4 continua sem um "rosto". Mas, mais importante do que isso, quase não havia jogos. Das demonstrações feitas, destaco o cansado vídeo de Agni's Philosophy, reciclado pela segunda ou terceira vez, a demonstração de Watch Dogs, que rodava num PC e, finalmente, Killzone: Shadow Fall, que teve, supostamente, parte do próprio jogo supostamente demonstrada ali no palco, ao vivo.

* * *

Mas, alguém leva muito a sério o que é mostrado em conferências desse tipo?

Aqui, a apresentação de Motorstorm, feita em 2005, no evento que revelou o Playstation 3:



E aqui está o Motorstorm que finalmente foi lançado e que você talvez tenha aí, em casa:



Parece o mesmo jogo?

* * *

Quaisquer que sejam os motivos para a Sony ter mostrado tão pouco conteúdo ontem (e certamente a vontade de ter uma presença forte e surpreendente na E3 é um deles), eu acredito ser inevitável que o PS4 e o próximo XBOX acabem tendo menos jogos produzidos e lançados pelos canais tradicionais do que as gerações anteriores de aparelhos.

O motivo é simples: está ficando caro e arriscado demais produzir o tipo de jogo que move a indústria.

Na época do NES, havia uma imposição por parte da Nintendo norte-americana de que nenhuma publisher podia lançar mais do que cinco jogos por ano, uma medida para tentar garantir a qualidade dos jogos que, de fato, seriam lançados. Esse limite era tão opressivo que as publishers tentavam burlá-lo criando selos subsidiários. A Konami tinha a Ultra Games, por exemplo, por onde lançou os jogos das Tartarugas Ninja.

Vamos supor que, em média, um jogo de NES fosse produzido por equipes de dez pessoas, durante dez meses. Vamos supor também, muito generosamente, que o salário de cada pessoa fosse US$5.000. O custo de desenvolvimento dos jogos (deixando de lado marketing, royalties, distribuição e fabricação dos cartuchos, notoriamente mais caros do que CD's, DVD's e Blu-Ray) seria, então, aproximadamente US$500.000.

Num jogo que vendesse um milhão de cópias, a US$50 cada, e gerasse, portanto, US$50.000.000 (cinquenta milhões de dólares) de receita bruta, os custos de desenvolvimento representariam 1% dessa receita.

Vamos saltar para a geração atual, do PS3 e do 360. Um estudo feito na indústria mostra que o custo médio do desenvolvimento de jogos atualmente é de US$28.000.000 (vinte e oito milhões de dólares).
Aplicando o mesmo cálculo anterior de um milhão de unidades vendidas a US$50 dólares cada, temos que o custo de desenvolvimento médio passou a representar 56% desta receita bruta!

Se esta é a média, quais são os jogos mais caros? Alguns exemplos:

- Grand Theft Auto IV: US$100 milhões
- Gran Turismo 5: US$80 milhões
- Shenmue: US$70 milhões
- Metal Gear Solid 4: US$50 milhões
- Final Fantasy XIII: US$50 milhões
- APB: US$50 milhões
- Killzone 2: US$40 milhões
- Call of Duty: Modern Warfare 2: US$40 milhões

Façam as contas. Quanto estes jogos precisam vender apenas para pagar seus custos de desenvolvimento? Será que jogos como APB e Shenmue recuperaram o investimento feito neles? (Shenmue, obviamente, não)

E este é um dado importante e interessante: o preço dos jogos mudou pouco nos últimos quase trinta anos, e nem sempre ele subiu. Ainda me lembro de ter pago U$72 no meu primeiro jogo de Super NES, Final Fantasy II. Mas na geração seguinte, a Sony praticamente tabelou todos os jogos do Playstation original em US$49. Recentemente, o preço médio subiu para US$59.

E as vendas? Quantos jogos vendem mais do que um milhão de cópias, a cada ano?

A conclusão óbvia dessas contas, todas muito aproximadas, é que o modelo de desenvolvimento atual simplesmente não é sustentável. Imagine, então, se o custo de desenvolvimento aumentar MAIS ainda, como é o que vai acontecer na próxima geração. Como digo no título o Playstation 4 (e o XBOX "720") vai custar caro, como negócio, como investimento.

Dá para entender, agora, algumas das transformações por que vem passando a indústria nos últimos anos:

- Os conteúdos vendidos à parte, os DLC, raramente têm em vista uma melhor experiência para o jogador, o consumidor. Eles são, principalmente, fonte extra de receita para as publishers. Tanto é que chegou-se ao cúmulo, em Tomb Raider Underworld, de retirar conteúdo originalmente destinado ao "jogo-base" e transformá-lo em material para ser vendido posteriormente como DLC. Outro exemplo é o jogo Street Fighter x Tekken, que tinha dentro do disco personagens que o jogador só poderia usar se "comprasse" a autorização, via DLC. O resultado disso é que o consumidor acaba comprando um jogo incompleto, e tendo que pagar mais depois para ter a experiência total.

- Jogos mais curtos. Custa tão caro produzir visuais de alta qualidade, programar e animar as cenas de história, que o resultado são campanhas single-player de 10, 8, e até 5 horas. É complicado medir o valor de um jogo pela sua duração, mas qual o tempo mínimo de jogo pelo qual você pagaria os US$59 que um jogo custa lá fora? (ou os R$150, R$200 que custam aqui?)

- Assinaturas pagas de serviços online, como o XBOX Live Gold, e a PSN Plus. Este item é até mais justificável, afinal serviços online exigem a manutenção de uma infraestrutura bastante cara. Mas, de qualquer modo, é mais uma fonte de receita para as empresas.

- Jogos que dependem de uma assinatura para serem jogados. É o modelo do MMORPG, você compra o jogo, e depois precisa pagar uma mensalidade para usar os servidores da empresa, já que eles só funcionam online. World of Warcraft é o jogo mais famoso neste gênero, rendendo, por ano, um bilhão de dólares para a Blizzard/Activision. Apesar do sucesso dos jogos offline, o Final Fantasy mais lucrativo para a Square Enix é FFXI, pelo mesmo motivo: as pessoas não só compram o jogo, como pagam uma mensalidade durante todo o período em que jogam. Então, mesmo que menos pessoas o comprem, a longo prazo cada jogador gera mais receita para a empresa.

- Jogos que são obtidos de graça, e que geram receita pela compra de itens opcionais dentro dele. É o modelo básico da indústria de games coreana, financiando a criação de MMORPGs colossais como Tera Online, que, estima-se, custou mais caro para ser produzido do que o próprio World of Warcraft (apesar do próprio Tera não usar este modelo, inicialmente)

- Menos jogos sendo lançados. Veja de novo o evento de apresentação do Playstation 3, de 2005. Metade dos jogos mostrados ali foram simplesmente cancelados: Eight Days, The Getaway, Killing Day, Fifth Phantom Saga. Qual o motivo? Com o custo de desenvolvimento de um jogo moderno, as desenvolvedoras e publishers simplesmente não vão terminar de produzir e lançar um título que pareça não ser capaz de vender milhões de cópias. É cada vez mais difícil aprovar a produção de um jogo numa grande empresa, e se ela perder a confiança no produto durante sua criação, ele é simplesmente cancelado, como modo de minimizar as perdas. O fracasso de apenas um ou dois jogos de grande porte pode fechar mesmo uma publisher de médio porte. Vide o que aconteceu com a THQ, recentemente.

- Como consequência do item anterior, o mainstream, as grandes empresas, estão cada vez mais conservadoras no tipo de jogo que lançam. Bioshock tem uma narrativa brilhante, mas sua mecânica tem pouco que o diferencie de outros FPS. E é assim que as grandes publisher querem que seja, porque sabem que a experiência tradicional que os FPS proporcionam é algo que vende. O mesmo não pode ser dito de Katamari Damacy, por exemplo. É uma experiência diferente, é desconhecido, não quantificado, portanto é arriscado. Quanto mais dinheiro envolvido, mais averso a riscos torna-se a indústria.

Enfim. Ter um publisher bancando a produção do jogo para, depois, obter retorno no investimento com vendas a preços tabelados, fora de seu controle, é o modelo econômico atual da indústria de games, e isso não é sustentável se os custos de produção continuarem subindo. E é claro que esses custos vão subir ainda mais na próxima geração de consoles, que precisa se diferenciar, por questões de marketing, através de gráficos mais complexos e realistas.
Observando a tendência de queda na quantidade de títulos do PS1 para o PS2 e, muito mais dramaticamente, para o PS3, é perfeitamente razoável supor que o PS4 terá ainda menos jogos lançados por publishers como Konami, Capcom, Square-Enix, EA, Activision, Take-Two, etc.

O cenário para os indies é bem diferente, e bem mais promissor. Comento em outro post.

Discussion

  1. Cara, na real só o tempo dirá, mas o que se diz é que o custo de desenvolvimento vai crescer pouco nessa geração: http://www.gamasutra.com/view/news/187037/We_asked_three_PS4_developers_how_expensive_their_games_are.php

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  2. As grandes publisher cada vez mais vêm diversificando a escala de investimentos/jogos que cria pra consoles. O mesmo tipo de jogo que um "indie" pode fazer, uma Activision pode fazer. Vimos exemplos disso no Xbox Live Arcade e na PSN durante essa geração.

    Como o Diego aponto acima, os custos de produção pularam quando começamos a ter jogos exigindo assets em HD. As mudanças e evoluções no desenvolvimento agora mal se aproximam desse salto e há novas ferramentas e engines sendo criadas o tempo inteiro para tornar mais simples e rápido certos aspectos do desenvolvimento: Inclusive isso está por trás de alguns grandes indies que já vemos hoje em dia.

    Veja só que é mais caro produzir um filme ou série de TV hoje do que em qualquer época no passado. Veja que os números de audiência na TV e de pessoas indo ao cinema caiu absurdamente nos últimos 10 anos. Você quer apostar que Hollywood está morrendo junto com os consoles?

    Me lembro muito bem de ouvir esse tipo de opinião fatalista sobre os consoles antes do Xbox 360 e do PS3. Assim que eles saíram e tinham jogos de 60 dólares, havia muita gente rápida em brincar de Nostradamus e dar atestado de óbito pra indústra. Entre 2005 e hoje nós vimos jogos de 5,10,15,20,40 e 60 dólares fazerem sucesso. Surgiram novos tipos de jogos NOS CONSOLES.

    Sim o cenário é diferente, sim há smartphones e appstores hoje em dia. Porém consoles oferecem outro tipo de experiência. Esse público tem se mostrado constante e novidades para conquistar novas pessoas sempre estão aparecendo. Há pessoas comprando consoles todos os dias.

    Eu não vejo o fato de que eu posso ouvir uma MP3 no meu telefone matando o mercado de home theaters.

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  3. Bom, o que vocês disseram é basicamente verdade, mas não afeta a conta: receita bruta fixa (vendas x preço do jogo) + custos de produção maiores = um negócio mais arriscado e mais conservador a cada geração que passa.

    Publishers fecharam, cada vez mesmo as grandes publishers lançam menos jogos tradicionais, etc, etc. Olha a quantidade de jogos que a Konami, a Square Enix, EA, Activision, etc, lançaram no PS2 e no PS3.

    Isso força mudanças na indústria, claro, citei algumas delas, depois vou comentar outras.

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  4. A quantidade de jogos por empresa pode ter diminuído. Mas a quantidade de empresas e indies fazendo jogos explodiu.

    A indústria tem mudado e crescido pra todo lado, mas não acho que isso vá matar o console.

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